domingo, 17 de fevereiro de 2013

Agra e Déli II - Deslumbre arquitetônico!

Fatehpur Sikri

Mas as construções eram lindas! Poder ver o legado do império que promoveu a última era de ouro à civilização indiana foi maravilhoso. Nessa terra colorida e pauperizada as construções Mogol se destacam imponentes, em branco, preto e vermelho. A visita a Fatehpur Sikri, ainda no início da viagem, foi impressionante (acho que foi um dos meus lugares favoritos!). Essa cidade construída por Akbar para celebrar suas vitórias, construída em red sandstone (da região da cidade mesmo) foi o nosso primeiro encontro com a arquitetura Mogol com seus detalhes, com cantos lindamente decorados com padrões geométricos e com pinturas de interiores e mármore branco com pedras incrustadas  formando flores e arabescos. Akbar era um líder sensacional, muito a frente de seu tempo, que governou o subcontinente indiano promovendo o sincretismo (ele tinha três esposas principais: uma hindu, uma cristã e uma muçulmana), abolindo os impostos que não-muçulmanos pagavam por não serem convertidos (jizya) e proibindo a escravidão por conquista, a perseguição religiosa e diminuindo a ostentação da corte Mogol. É muito interessante ler sobre como ele articulava coligações, sempre humilde e ávido por conhecimento, convidando chefes das regiões e seitas a se hospedarem nos seus palácios para ensinarem a ele a zoroastria, o cristianismo, alquimia. Ele foi o primeiro muçulamano a aceitar  e reconhecer a presença portuguesa no continente e justamente, casou-se com um cristã de Goa. Controlava então o subcontinente através das relações entre as elites e do magnetismo que a sua personalidade exercia: Akbar era disciplinado, erudito e progressista. A síntese dessas duas maneiras de governar pode ser reconhecida na espécie de religião criada por ele que pregava a tolerância a todas as crenças, o reconhecimento da existência divina e o estímulo ao estudo racional do transcendente. Akbar era grande e infelizmente ímpar, pois mesmo que a maioria dos imperadores mogóis tenham tentado gerenciar aquela colcha de retalhos que era o hindustan - muitas vezes praticamente "descosturada"- através das alianças com elites diversas, nenhum o fez com a maestria dele. No final do império (e principalmente os dois últimos grandes imperadores) a jizya foi restaurada, a perseguição religiosa e as conversões em massa também. Lá eu estava, portanto, na cidade dele e logo depois visitando a sua tomba, muito bonita cercada de jardins com frágeis antílopes e esquilos, e austera por dentro, para representar a sobriedade e seriedade do imperador.

Escuridão e claridade na vida de Shah Jahan
A história de Shah Jahan, o imperador que construiu o Taj Mahal, não é tão bonita quanto a de Akbar, mas o Taj é realmente uma das coisas mais lindas que já vi na minha vida. Tu vês aquela imagem a tua vida toda, repetidas vezes e em todos os estilos e chegar lá e perceber: é,  aqui estou eu do outro lado do mundo, é sensacional. Nem as milhares de pessoas, nem o cheiro ruim dentro da tumba puderam estragar a impressão de conhecer aquele gigante branco. Ele é lindo de todos os ângulos, como pudemos averiguar passeando por lá e depois admirando-o de longe do Forte de Agra. Acho que todos já sabem que ele foi construído como tumba para a esposa mais amada de Shah Jahan, Mumtaz Mahal, que faleceu ao dar à luz ao décimo quarto filho do casal. Conta-se que ela foi extremamente influente no governo do seu marido que apesar de retrógrado em relação à religião (ele proibiu muçulmanos de trocar de religião e criou uma diferenciação obrigatória de vestes entre os hindus e muçulmanos, depois de um embaraçoso engano dele ao tratar bem um hindu vestido como normalmente fazem os crente no islã), teve alguns avanços na formalização da burocracia do Império. Shah Jahan tinha grande interesse pelas artes (até cantava para convidados especiais) e era apaixonado por arquitetura. Ele crivou Agra e Déli de palácios majestosos e, orgulhoso, inscreveu em um hall para o publico em Déli: "Se houver algum paraíso na terra, é isso aqui, é isso aqui, é isso aqui!" Apesar da opulência e desfrute ao longo de sua vida, Shah Jahan teve um triste fim. Adoentou-se seriamente no meio de sua vida e desencadeou um movimento alucinado de conquista e disputa, por partes de seus filhos (que governavam regiões do domínio mogol) para decidirem a sucessão. Até api tudo normal pro Mogóis, no qual a disputa estre irmãos era quase um rito de passagem para o futuro imperador. A parte terrível/patética é que ele Shah Jahan se recuperou totalmente pouco tempo depois e poderia governar por mais vinte anos, mas os seus filhos já estavam impelidos na luta e não voltariam atrás. Depois de uma traumática e longa guerra o vencedor Aurangzeb, conquistou Agra e aprisionou seu pai no forte da cidade até o final da sua vida, que, com as péssimas condições que a reclusão reservavam, durou apenas mais oito anos.
Lótus Temple
Além das lindas mesquitas, palácios e fortes também visitamos dois templos diferentes, já em Déli. Um deles, o Templo de Lótus, era muito bonito, no formato da flor, com nove entradas e um ambiente sereno e silencioso no interior. Ele é a casa indiana da religião de devoção Bahá'i, uma religião muito louca que prega a abolição das fronteiras, instauração de uma corte mundial de justiça e pretende construir com contribuições diversas uma crença que una todas as devoções do mundo na adoração de um só Deus com muitos nomes. Interessante. O outro templo, o Akshardham Mandir, foi uma interessante surpresa a alguns quilômetros de Déli (muito bem recomendado pela Thaís, apesar de não constar em nenhum site de dicas que eu visitei). O templo celebrava a adoração do Swaminarayan Akshardam (swami é como um sacerdote/santo hindu). Ele era composto por vários jardins, demarcados com portais e colunas maravilhosos, cada um esculpido de maneira diversa, mostrando figuras humanas, elefantes, deuses do hinduísmo e a vegetação do norte e centro da Índia. O nível de detalhamento e qualidade das esculturas era impressionante, quase inacreditável e ficava ainda mais irreal quando se considerava que todo aquele trabalho havia sido feito por voluntários adoradores do swami. Cada elefante com a expressão diferente, com as trombas e texturas da pele tão perfeitas que pareciam que faltava pouco para que eles se descolassem da parede e começassem a andar pelos jardins (uma viagem tipo Dumba bêbado, pra quem teve infância com filmes da Disney). O prédio principal do templo era tão bonito por fora quanto o resto das esculturas e absurdamente lindo por dentro. As figuras de deuses e sacerdotes se multiplicavam pelas paredes de mármore branco e uma grande estátua do Swami feita em ouro repousava no centro de um altar, em posição de meditação. Pudemos ler e ver a história da vida dele em quadros muito bonitos ao longo da volta pelo prédio e ver as maravilhosas figuras das divindades hindus na sua forma dual, sempre com a expressão masculina e feminina da energia do deus, que, pelo que ficamos sabendo, foi uma valiosa recuperação do swami ao culto hindu, que andava se encaminhando pra religiosidade patriarcal e relegando às deusas posições inferiores. Depois dessa volta, ainda passamos algumas horas dando voltas pelo complexo. O clima era agradável e quieto, graças a política do mandir de não aceitar câmeras fotográficas, mochilas, laptops ou celulares. Aproveitamos a vista, conhecemos o lugar e ainda encontramos uma loja de livros ótima dentro do templo, onde compramos livros legais e baratos sobre hinduísmo e vegetarianismo. 

Akshardham Mandir (a foto não é minha, já que não dava pra entrar com máquina)
Já cansadinhas, ainda visitamos dois parques na nossa estada, com características contrastantes. Um era o parque que abriga o India Gate, monumento erigido para homenagear os soldados indianos na segunda guerra mundial. Parque cheio de gente jogando críquete, lanchando com os filhos, curtindo o final de semana. Por que cheio também muito sujo e barulhento. O outro, foi o parque que acompanha parte do rio Yamuna, que corta a cidade de Déli. Íamos em busca do Raj Ghat, onde estavam as cinzas de Gandhi, mas como não sabíamos direito onde ficava e o parque era enorme, demos uma bela caminhada por dentro da área verde planejada e bem cuidada, com vários laguinhos aqui e ali pra descansar e curtir a visão agradável das árvores, da grama, das colinas e lindas pedras distribuídas pelo caminho. O túmulo do Gandhi não foi nada muito emocionante, por que também já era fim do dia e fim da viagem e tudo que queríamos era uma noite de sono e o acerto de contas no hotel, por que já íamos felizes pegar o trem de volta pra nossa casa indiana! E olha só como fomos recebidas:

Cerimônia das luzes dos vizinhos, passando com a caravana aqui em casa



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